Myxomatosis

2008
Solon Ribeiro
publicado em 21.09.2015
última atualização 21.09.2015

"Comecei meu percurso artístico pela fotografia, cruzando-a com outros gêneros formais, como o texto, a música, a instalação, o filme. Privilegiando desde cedo a pesquisa em torno da imagem, de caráter performativo ou experimental.

Nos anos 1990, herdei do meu pai uma coleção de mais de trinta mil fotogramas de filmes...


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"Comecei meu percurso artístico pela fotografia, cruzando-a com outros gêneros formais, como o texto, a música, a instalação, o filme. Privilegiando desde cedo a pesquisa em torno da imagem, de caráter performativo ou experimental.

Nos anos 1990, herdei do meu pai uma coleção de mais de trinta mil fotogramas de filmes originários principalmente do cinema clássico. Esse arquivo constitui uma fonte inesgotável de imagens da memória do cinema e um material de trabalho para minhas experimentações. Venho deslocando esse material em diversas configurações com o intuito de desprogramar o dispositivo clássico e ativá-lo para outras possibilidades de fruição. Desejo evidenciar a materialidade desse material e abri-lo para reconfigurações articuladas pela imaginação do espectador. Quero investigar o poder e os aspectos mágicos e metafísicos da imagem, potencializando sua crueza, sem o amortecimento de Hollywood. Desejo convidar o espectador para participar da mobilidade da obra, para se perder na imagem, como uma forma de se renovar, como uma resistência às imagens-clichê e verdades preestabelecidas e veiculadas pelo poder.

O cinema que venho desenvolvendo tenta problematizar o estatuto do arquivo. Tenho o intuito de desconstruir a íntima relação que ele estabelece com o passado por um desejo de experimentar outros modos de fazer cinema, subvertendo as regras de apresentação e de representação do real. Proponho uma interrogação crítica sobre as condições da percepção, do sentido da imagem e sua recepção, possibilitando novas experiências e uma nova espacialidade para a linguagem cinematográfica, um retorno a corporalidade.

O principal fundamento estético das minhas experiências é a arte da montagem, evidenciada pela reiteração no uso de determinados frames e pelo retorno ou modificação de certos dispositivos. Quando eu retiro os frames, os libero da narrativa e os desloco para outros contextos. O vídeo Myxomatosis, em particular, é o mais representativo da minha busca por um cinema que seja um diálogo de corpos, de luz e carne. 

Quero libertar, dar autonomia as imagens, deixá-las ao léu, para que possam encontrar outros espaços de repouso ou de vôo. Nas minhas pesquisas, existe uma preocupação em valorizar o gesto do operador, em relação ao do criador-autor. Trata-se de uma atitude de consagração da perda da aura. Sinto-me feliz de participar deste momento em que o cinema abandona a caverna de Platão e começa a se libertar da literatura, da sociologia, da psicologia, tornando-se simplesmente uma imagem em direção do branco sobre branco de Malevich ou do vazio do teatro de Samuel Beckett. Penso que, para atingir o mínimo do minimalismo, é preciso atravessar o buraco do barroco. Um fotograma, um som, um zoom, o mais profundo em direção a abstração total do detalhe, ao mais elevado grau de luz. Navegar é preciso e um lance de dados é necessário."


Solon Ribeiro em depoimento à PLATAFORMA:VB (julho 2015)


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Dados técnicos

Myxomatosis, 2008 | Vídeo, 4’28”
Solon Ribeiro

Exposição Cinema Playground | Solon Ribeiro (2014)

A repórter Letícia Amaral mostra a exposição O Cinema é meu Playground do artista Solón Ribeiro. (UFC TV, Universidade Federal do Ceará, canal TVC/Canal Brasil, 2014) [pt]

O Cinema é meu Playground (2014) | Luciana Magno 

Registro da exposição de Solon Ribeiro feito pela artista Luciana Magno 

Ações VB
19º Festival
Outras conexões

“A primeira versão de Myxomatosis foi realizado em 2008 como um dos episódios do vídeo Sage (2008-2009). O vídeo também foi editado para o filme Perdeu a memória e matou o cinema. Ele adquiriu autonomia quando instalado em um canal.” 

“Minhas pesquisas com vídeo vêm desde os brinquedos ópticos do século XIX, passando pelas vanguardas artísticas de meados da década de 1920, pelo underground norte-americano de 1950/1960 e pela videoarte. Mas gostaria de ressaltar a importância da obra de Jean–Luc Godard na minha formação. Não somente seu cinema, mas seu pensamento, suas ações. Godard é um corpo de imagens, 'Existo mais enquanto imagem do que enquanto ser real, pois minha única vida consiste em fazê-las'. Essa fala do Godard representa uma bússola, que indica-me a possibilidade de extrapolar a concepção do fazer cinematográfico, desafiando as possibilidades além das fronteiras estabelecidas por seu código, para experimentar uma poética de fluxus.”

“Em Myxomatosis, poderia evocar a atitude radical de Hélio Oiticica com os Parangolés que, segundo o artista, tratam da 'incorporação do corpo na obra e da obra no corpo'. O caráter ritualístico do Acionismo Vienense é também uma referência importante para o vídeo.”

Anexos

Coleção Solon Ribeiro

Coleção de fotogramas de cinema de Solon Ribeiro

Reinventando o cinema da infância (O Globo, dez. 2009) [pt]

Dos fotogramas ao cinema menor: dispositivos, montagem e movimentos na obra de Solon Ribeiro, dissertação de mestrado de Annádia Leite Brito (Pós-graduação em Artes, Instituto de Cultura e Arte da Universidade Federal do Ceará, 2015) [pt]

Perdeu a memória e matou o cinema (Solon Ribeiro (Org.) +2 Editora, 2013). [pt]

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