Journey to a Land Otherwise Known

2011
Laura Huertas Millán
publicado em 28.06.2013
última atualização 08.09.2014

"Journey to a Land Otherwise Known faz parte de uma série, iniciada em 2009, sobre o conceito de ‘exotismo’. A origem da série – que inclui Sin Dejar Huella (Without Leaving a Trace) (2009) e Aequador (2012) – foi a descoberta de um livro de fotos retratando nativos Mapuches no Jardim de Luxemburgo, em Paris, no início do século 20. A...


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"Journey to a Land Otherwise Known faz parte de uma série, iniciada em 2009, sobre o conceito de ‘exotismo’. A origem da série – que inclui Sin Dejar Huella (Without Leaving a Trace) (2009) e Aequador (2012) – foi a descoberta de um livro de fotos retratando nativos Mapuches no Jardim de Luxemburgo, em Paris, no início do século 20. A memória marcante desse povo desaparecido, obrigado a se exilar e exposto na França, me perturbou por muitos anos.

Este trabalho é inspirado nos primeiros relatos das expedições naturais e etnográficas empreendidas à América por colonizadores, missionários e cientistas. O filme foi inteiramente filmado na Estufa Tropical de Lille, um edifício construído em 1970 por Jean-Pierre Secq, uma espécie de Palácio de Cristal botânico de concreto reforçado. 

A arquitetura e as plantas deste local fechado são usadas como suportes narrativos para uma jornada de iniciação, apresentando a fala de um ‘explorador’ e suas visões. As plantas materializam vestígios da história deste conhecimento botânico, constituída por apropriações, deslocamentos e exílios. Como uma alegoria da conquista em si, Journey to a Land... termina com as primeiras laranjeiras (sementes europeias) plantadas na América.

O lado fantástico e onírico do filme foi uma maneira de contradizer todo o discurso racionalista e até o meu próprio discurso acerca dele. Eu queria destacar o poder de alucinação das plantas de modo literal e figurativo, permitindo que imagens estranhas e incomuns surgissem.

Jornadas literais e figurativas me levaram ao cinema enquanto mídia, mas também enquanto tema. Tenho um interesse particular por sua representação da alteridade: representações etnológicas, arquivos históricos, a iconografia estabelecida pelo cinema de massa. A porosidade entre documentos e representações, notícia curta e história coletiva, conhecimento e perversidade, narração e delírio está no centro da minha escrita. 

O filme propõe um pastiche de um filme etnográfico num espaço fechado, uma selva artificial numa estufa tropical europeia, com uma narração em off de um homem branco descrevendo a descoberta do ‘outro’, o ‘estranho’. Ao desconstruir o formato dos filmes etnográficos clássicos (narração masculina em off explicando o que vemos), eu queria lançar dúvidas sobre a veracidade do discurso taxonômico usado pela cultura ocidental para descrever a alteridade. Journey to a land... evoca a origem violenta do ‘Novo Mundo’ e a subsistência do imaginário que ela engendrou.

Quando produzi Journey to a Land... o clima político na França (o país onde vivo há 12 anos) estava cada vez mais agressivo contra os estrangeiros e imigrantes, com novas leis de imigração, aceitação de extremismos e discursos políticos que banalizavam comentários e atitudes xenofóbicas. Eu reconheci os discursos políticos daquele período como um revival da figura do 'selvagem'. Infelizmente, o racismo ainda é uma questão importante na cultura ocidental atual, presente em todas as alas do panorama político.

De forma semelhante, naquela época, os sobreviventes de sequestros pelas FARC publicaram livros sobre seu cativeiro na Colômbia. A construção iconográfica em torno desses fatos, na Colômbia e na França, me marcou. Eu senti que ambas as culturas ainda estavam presas a um discurso colonial e precisavam de uma nova sintaxe e das palavras certas para articular nossos dramas atuais e contemporâneos, ao invés de uma simples dicotomia entre ‘civilizados’ e ‘selvagens’”.


Laura Huertas Millán em depoimento à PLATAFORMA:VB (outubro 2013)


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Dados técnicos

Journey to a Land Otherwise Known (2011) | Laura Huertas Millán
Vídeo | 22’17”, Dolby Surround Prologic 1, cor, 16 : 9
 

Journey to a Land Otherwise Known (2011)

Depoimento Laura Huertas Millan | 18º Festival

Segundo a artista, o vídeo, gravado em um viveiro tropical na cidade francesa de Lille, coloca o espectador entre dois polos: o do questionamento político e o da experiência sensorial e fictícia

Como era gostoso o meu francês (1971) | Nelson Pereira dos Santos

"A principal referência que me levou a realizar Journey to a Land...vem do cinema brasileiro: Como era gostoso o meu francês (1971)", afirma a artista.

 

Cannibal Holocaust (1980) | Ruggero Deodato

Referências para Journey to a Land...:  "Ficções de Hollywood e européias que representam a floresta de uma forma exótica", explica a artista.

First blood - Rambo (1982) | Ted Kotcheff

 

 

Predator (1987) | John MacTiernan

 

 

Apocalypse Now (1979) | Francis Ford Coppola

 
 

Avatar (2009) | James Cameron 


 

The Emerald Forest (1985) | John Boorman


 

Tropical Malady (2004) | Apichatpong Weerasethakul

 
 

Aguirre, the Wrath of God (1972) | Werner Herzog 


 

The Thin Red Line (1998) | Terrence Malick

 
 

Panis et circenses (Live French TV - 1969) | Os Mutantes

Os Mutantes, Caetano Veloso e Gilberto Gil também influenciaram a artista. 

Alegria Alegria (1968) | Caetano Veloso

Caetano Veloso canta em 1975

Back in Bahia (1972) | Gilberto Gil 

Ações VB
18º Festival
Sobre modos de ver
Outras conexões

A obra de Laura Huertas Millán se une ao legado antropofágico do Brasil em sua utilização da estética carnavalesca: máscaras e fantasias como forma de parodiar um arquivo histórico. "Abordagens híbridas, imprevisíveis políticas e mestiças, como o Tropicalismo Brasileiro, o Afrofuturismo e os estudos pós-coloniais ainda são grandes inspirações para meu trabalho”, explica a artista. 



Sobre o filme Como era gostoso o meu francês (1971), de Nelson Pereira dos Santos, uma das principais influências para Journey to a Land.... , a artista afirma, "Adaptação livre e carnavalesca da obra de Hans Staden, História Verdadeira e Descrição de uma Terra de Selvagens, Nus e Cruéis Comedores de Seres Humanos, Situada no Novo Mundo da América (1557). No texto original, Hans Staden é um sobrevivente a diversos meses de aprisionamento pelos Tupinambás, uma tribo do período pré-colonial brasileiro. No filme de Pereira dos Santos, entretanto, o europeu é de fato comido pelos Tupinambás"



Os relatos de viagens na selva que serviram de referência para Laura Huertas Millán incluem:
O coração das trevas (1902),de Joseph Conrad
La Vorágine (1924), de José Eustacio Rivera 
Os contos de Horacio Quiroga, relatos de viagem como os diários de Cristóvão Colombo e Alexander von Humboldt e textos etnográficos relacionados ao xamanismo, como One River: Explorations and Discoveries in the Amazon Rain Forest (1996), de Wade Davis.  



O Manifesto Antropófago (1928), de Oswald de Andrade e Tropicalia (1967), de Helio Oiticica foram as principais influências do ‘mundo da arte’. Os Mutantes, Caetano Veloso e Gilberto Gil também influenciaram a artista. 



Outras influências incluem as representações botânicas do período colonial na Colômbia, principalmente as imagens da Expedição Botânica, no início do século 19 e a obra de Mauricio Nieto Olarte, Remedios para el imperio. Historia Natural y La apropiación del Nuevo Mundo (Uniandes, 2009), "que relaciona as expedições botânicas à classificação das espécies americanas nativas e à história do colonialismo".

Anexos

Universo vídeo. Reflexionando a través de la imagen, por Semíramis González (semiramisenbabilonia.blogspot.com, abr. 2013). [eng]

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