"Uma das linhas de força do meu trabalho se refere à estratégias para compreender melhor: rotas, estradas, caminhos, abordagens, sistemas, maneiras de apreender.
Em Possible Ways to Return Home (2011) a ideia era traçar um caminho até minha casa; o local onde escolhi viver, meu refúgio. O caminho era formado por frases, diálogos de meus filmes prediletos, aqueles que assisti quando comecei a pensar na imagem em movimento, como O Raio Verde (1986), de Éric Rohmer; Uma mulher é uma mulher (1961) e Viver a vida (1962), de Jean-Luc Godard.
Em Loucos de Amor (2009), duas garotinhas leem Fool for Love (1983) de Sam Shepard. Muitas palavras são lidas ou ditas pela primeira vez. Consequentemente, há dificuldade na leitura e em sua compreensão. Elas hesitam, elas têm dúvidas, elas desconstroem uma história de amor.
A leitura de texto em diferentes contextos é ressignificada permanentemente. Tenho interesse em refletir sobre os mecanismos da compreensão textual, como se fossem mapas que nos permitissem conhecer melhor o mundo e, a partir disso, traçar rotas possíveis.
Em Conversation Piece, duas meninas leem o Manifesto Comunista (1848) com sua avó. Há muitos conceitos que elas não entendem. Lendo e fazendo perguntas, as meninas procuram compreender. Elas criam rotas e possibilidades, cada palavra com seu significado.
Essa obra é quase uma autobiografia. É minha mãe que explica, é ela que dá significado a essas perguntas. Ela lê o Manifesto Comunista com minhas sobrinhas. Não há nenhum subtexto; tudo precisa ser desvendado, exposto, como se fosse a primeira vez.
Em um passe de mágica, a geração anterior transmite o conhecimento à próxima. Assim, o movimento é contínuo, novas perguntas surgem, outras narrativas e novas direções aparecem.
A pintura de conversação (conversation piece) é uma tipologia especial das narrativas pictóricas de grupo, muito frequente nos séculos XVII e XVIII. Uma conversa em família, alguém tocando um instrumento musical, um cachorro, a noite que cai, pouca luz, o tempo passando.
Eu lembro de momentos da minha infância: a família compartilhando um espaço na cidade, a passagem do tempo, alguns amigos, nenhum animal de estimação. Minha família conversava sobre maneiras de construir um mundo melhor, e sobre o comunismo como sendo essa maneira. Eram tempos de ditadura e essas conversas particulares precisavam ser mantidas em segredo. As crianças escutavam, prestavam atenção e nada deveria ser repetido fora daquele espaço. Esta imagem foi o início de tudo. Foi minha ‘pintura de conversação’."
Gabriela Golder em depoimento à PLATAFORMA:VB (outubro 2013)