Beit El Baher (The Beach House)

2016
Roy Dib
publicado em 01.10.2017
última atualização 01.10.2017

Meu curta-metragem, Mondial 2010 (Teddy Award de Melhor Filme de 2014, em Berlim) é um filme de viagem que segue um casal homossexual libanês em uma viagem a Ramallah que é impossível na vida real, visto que Líbano e Israel são estados inimigos. Este formato "huis clos" [entre quatro paredes] solto de um casal encerrado dentro de um...


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Meu curta-metragem, Mondial 2010 (Teddy Award de Melhor Filme de 2014, em Berlim) é um filme de viagem que segue um casal homossexual libanês em uma viagem a Ramallah que é impossível na vida real, visto que Líbano e Israel são estados inimigos. Este formato "huis clos" [entre quatro paredes] solto de um casal encerrado dentro de um veículo, preso em uma cidade que desapareceu, permitiu-me explorar uma relação muito intensa entre os personagens devido à claustrofobia gerada. Em A Spectacle of Privacy [Um espetáculo de privacidade], adaptei esse "huis clos" para uma instalação, na qual o público é convidado a entrar no quarto do casal, um intruso nesse espaço privado e cândido. Os participantes ficam fisicamente presos dentro de uma narrativa que os obriga a repensar sua posição em relação ao conteúdo.  E aqui em The Beach House [A casa de praia], exploro este contexto de "huis clos" no campo do cinema.

 

Percebi-me cada vez mais intrigado com o modelo de "huis clos" explorado internacionalmente em filmes como O discreto charme da Burguesia, de Buñuel e A Noite, de Antonioni, e também em obras de artistas locais, como A Montanha, de Ghassan Salhab e Yema, de Djamila Sahraoui. Senti que essa estrutura de claustro é uma representação dramática bem sincera do estado do mundo árabe hoje. Embora tenha havido um aumento vívido na produção local, poucos filmes libaneses ou árabes experimentam com estruturas dramáticas para se adequarem aos seus contextos. O diálogo também é bastante clássico na maioria das produções locais.

 

Com este projeto, procurei explorar maneirismos individuais, interações em grupo, atuação e estilo cinematográfico para criar um cinema em contexto.  The Beach House não se enquadrava às normas de produção existentes de se fazer cinema no mundo árabe. Ao contrário das produções seguras e roteirizadas, em que o produto final pode ser previsto desde o início, o enredo e o diálogo de The Beach House foram improvisados ​​com atores que interpretavam livremente seus personagens estreitamente definidos. Esse processo de construção de personagens dominou a fase de pré-produção do filme, em que os atores aprenderam os personagens em vez de aprender o roteiro, na presença do diretor de fotografia e do engenheiro de som, ambos participando da produção da sensação imagética, do som e da familiaridade com os atores.

 

Durante esse processo, trabalhei juntamente com Raafat Majzoub, co-diretor do filme. Depois de um mês e meio de oficinas de improvisação com os atores com base em contextos que Raafat e eu propusemos aos atores, tiramos um período de um mês para escrever o roteiro final a partir do material coletado da improvisação e da nossa própria contribuição e visão.

 

A fase de produção, bem como a filmagem do filme, foi uma espécie de experimentação. Com o diretor de fotografia Karim Ghorayeb, passei horas no local discutindo o clima e as escolhas cinematográficas de cada cena sem escrever nada. Decidimos filmas as cenas cronologicamente, como se  vê no resultado final, deixando espaço para o diretor de fotografia levar suas escolhas artísticas ao set e com base em nossas discussões. As decisões finais foram tomadas a cada momento, em discussões com o diretor de fotografia e Raafat Majzoub, co-diretor do filme.

  

Um dos aspectos mais importantes de The Beach House é que ele não foi roteirizado desde o início. Ao procurar uma representação alternativa da "imagem árabe", não estamos tentando ditar o que essa imagem é. O processo de escrita incorpora as partes interessadas, incluindo o elenco, a equipe e a ambientação de forma quase religiosa. É através desse constante brainstorming, dessa abordagem participativa para contar uma história que o filme adquire seu ponto de vista. Criar esta nova "imagem árabe" baseada em uma técnica de improvisação não é meramente uma escolha artística, mas sim política. Não estamos interessados ​​em ditar essa imagem. Propomos que esse passo à frente na produção cultural árabe seja dado por meio da participação e da co-imaginação.

 

The Beach House conta a história de quatro personagens, um grupo sem líder, que jantam em uma casa de praia. No núcleo da dinâmica, os personagens, através das conversas na mesa, se convidam reciprocamente a destruir as personas uns dos outros, a abalar suas performances públicas para finalmente chegarem a uma verdade com a qual eles não sabem o que fazer. O ritmo do filme acelera com sua adrenalina, pois eles ficam viciados na demolição de sua própria imagem. Através da improvisação, há a mesma relação entre os personagens e nós, enquanto demolem toda imagem projetada que temos da narrativa. De forma romântica, poderíamos considerar que o filme trata das máscaras que colocamos e nossa jornada eterna para encontrar pessoas que podem ver através delas. Socialmente, é uma comparação entre a atuação público e a revelação pessoal. Politicamente, o retrato da verdade como catástrofe, e a imagem/representação como pós-catástrofe.

 

Roy Dib em depoimento a PLATAFORM:VB (Agosto 2017)


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Dados técnicos

Beit El Baher2016 | Vídeo, 75'
Roy Dib

Ações VB
20º Festival
Outras conexões

O filme foi filmado em uma casa de praia projetada e construída pelo arquiteto iraquiano Rifaat Chadirji em Halet, uma aldeia ao norte do Líbano. "Rifat Chadirji nasceu em 6 de dezembro de 1926 em Bagdá. Ele é considerado um dos principais arquitetos iraquianos do século XX. Chadirji impregnou seu trabalho com uma profunda compreensão das raízes da autêntica expressão regional, bem como uma verdadeira apreciação do modernismo e seus princípios. Chadirji demonstrou uma capacidade única para a síntese de forma e função que traduz expressões arquitetônicas tradicionais em expressões contemporâneas". 

 

Acredito que os experimentos essenciais de Chadirji em fundir o moderno e o tradicional e experimentar com os efeitos de novas técnicas sobre o último permanecem relevantes até hoje. A produção atual do espaço parece ter saltado sobre o que Chadirji estava tentando resolver. Seus ícones foram danificados ou demolidos em vez de estudados, e vejo isso como uma oportunidade para explorar um desses ícones restantes no cinema. Creio que a vivacidade de um ícone vem de seu uso como ferramenta – não apenas como um lembrete – e, ao explorar a casa de praia de Chadirji neste projeto, espero prestar homenagem a um arquiteto que se recusou a simplesmente adotar formas do passado e buscou criar uma linguagem para o seu tempo.  

 

Sobre as pinturas e esculturas

 

A casa, no contexto do filme, foi herdada do pai pelas duas irmãs. Não vemos o pai no filme, mas a partir dos elementos da casa e do modo como as meninas falam sobre ele, ficamos sabendo que ele era um intelectual que amava a arte e estava muito perto de alguns artistas e intelectuais de sua geração, que costumavam visitá-lo na casa. As pinturas na parede e as esculturas são, supostamente, parte da coleção do pai. Eles são os vestígios dele e as testemunhas da história dessa casa.

 

Pinturas cortesia de Abraham Karabajakian e Roger Akoury

Blue sun (1990) Helen Khal  

Baroque (1970) Shafic Abboud

Instantanée (1970) Shafic Abboud

Appolo (1976) Saliba Douaihy

Untitled (1976) Saliba Douaihy

Landscape (1983–1984) Etel Adnan

 

Fotografia cortesia da Galeria Tanit, Beirute - Naila Kettaneh-Kunigk

Sherihane (1987) Fouad Elkoury

 

Esculturas cortesia da Agial Gallery, Beirute - Saleh Barakat 

Brass, da série Dual (1985–1987) Saloua Raouda Choucair

Brass, da série Module (1978–1980) Saloua Raouda Choucair

Resin (1971) Michel Basbous

Travertino persiano rosso (1976) Alfred Basbous

No Acervo VB
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