Este trabalho teve um longo processo de pesquisa, com algumas reviravoltas. Comecei a partir de um interesse em um músico chamado Udi Hrant Kenkulian, um instrumentista turco-armênio cego, apenas porque gostava da música dele. Ao iniciar a pesquisa, rapidamente percebi que Kenkulian viveu em um período de grande agitação musical na região otomana....
Este trabalho teve um longo processo de pesquisa, com algumas reviravoltas. Comecei a partir de um interesse em um músico chamado Udi Hrant Kenkulian, um instrumentista turco-armênio cego, apenas porque gostava da música dele. Ao iniciar a pesquisa, rapidamente percebi que Kenkulian viveu em um período de grande agitação musical na região otomana. Isso me levou a Istambul, onde a maior parte da pesquisa ocorreu.
O projeto se tornou uma reflexão sobre a história e o estado contemporâneo da música modal "oriental" após o desmantelamento do Império Otomano e o surgimento de nacionalismos durante os vários incursos em direção à modernidade na virada do século 20.
Nesse período, os etnomusicólogos coletaram e organizaram peças folclóricas rurais, que eles desprendiam umas das outras para construir novos repertórios musicais destinados a refletir as chamadas identidades nacionais puras.
No lugar das influências curdas, armênias, gregas e árabes, a música turca moderna, por exemplo, voltou-se para a notação ocidental, para harmonias polifônicas e assim por diante.
A pesquisa incluiu a realização de entrevistas com historiadores, etnomusicólogos e músicos; colaborações com coristas de igreja e fabricantes de instrumentos, pesquisa em bibliotecas e arquivos e visitas às estações de rádio de Istambul e Ancara. Também fiz aulas de canto, vasculhei coleções de discos, visitei cemitérios, igrejas, mesquitas, zawyas. Li e então me encontrei com pessoas para que elas explicassem o que eu estava lendo, ou me indicassem o que eu não estava lendo.
Este trabalho é semelhante aos meus outros trabalhos na medida em que combina várias escalas de narrativas, do micro para o macro, ou do pessoal para o histórico: passando das letras de uma música de amor para este momento maior da modernidade da música modal do Oriente Médio. O projeto também escava a política de algo que não está necessariamente presente na superfície. A principal diferença dessa obra, eu diria, tem a ver com o fato de que este foi o primeiro projeto em que lidei com um momento abertamente histórico e no qual grande parte da pesquisa teve a ver com práticas pré-modernas e como elas mudam com o advento da modernidade. Em relação ao filme, particularmente, este também foi o primeiro filme que fiz que não é um vídeo-ensaio e em que as imagens encontradas estão praticamente ausentes.
Em Not Every Day is Spring [Nem todo dia é primavera], tentei criar uma experiência sensorial a partir de texturas, sons e imagens, que se tornaram portadoras de ressonâncias históricas também contidas nos corpos dos músicos e de seus instrumentos e nos materiais dos edifícios que os abrigam. O projeto como um todo (que inclui escultura, desenho, performance) e o filme em particular procuram capturar essas ressonâncias frequentemente inaudíveis, refletindo sobre deslocamentos e amnésias, bem como resilências e lembranças em face das doenças que continuam a assolar a região nos dias de hoje. Ao observar o entrelaçamento histórico das tradições musicais da região, na verdade busco refletir sobre a violência exercida pelas fronteiras, por um lado, e, por outro, sobre sua incapacidade de conter as ondas sonoras e as da migração e da cultura humanas.
Haig Aivazian em depoimento a PLATAFORM:VB (Agosto 2017)
- Dados técnicos
Not Every Day Is Spring, 2016 | Vídeo, 46'
Haig Aivazian
- Ações VB
- 20º Festival
- Outras conexões
We Are Sick, But We Are Alive, conversa de Haig Aivazian com Rayya Badran (Ibraaz, 2017) [eng]
Film/Art | News from Anywhere, Nowhere, Home: Notes on the BNLMTL, por Andrea Picard (Cinema Scope) [eng]