"Na pesquisa para Pendular, sublinho uma preocupação em esperar, em não se precipitar diante da primeira imagem, deixando que a duração a faça estabilizar. Para escrever a escuta do que nos cerca é preciso deixar as coisas voltarem a reverberar. Sempre trabalhei com a proposição de atos para o corpo, nos quais a performance ganha propagação por meio de imagens fotográficas ou vídeos. Em contextos e cidades diferentes, percebi que as relações que crio entoam qualquer coisa sonora e que a pausa também pode formular imagens. Nesse sentido, tenho buscado cada vez mais dilatar a espera e demorar no processo. Ao sobrepor diversas temporalidades, passei a compor as imagens da experiência vivida, sublinhando a conversa com o outro. O outro, aqui, é o distante que se torna próximo, que volta a se distanciar: é essa música silenciosa que flui.
A imagem do corpo sozinho em Pendular convoca uma relação que se desdobra no 'entre'. É sobre esta imagem, que reúne um conjunto de pormenores colecionados no tempo, que o outro pousa como citação. A insistência na duração permite variar os modos de interlocução com a figura múltipla dos diversos encontros sonoros que atravessaram o processo: a composição que acompanha Pendular, diferente a cada montagem, dá a ver esta multiplicidade. Assim se refaz, na obra, a dimensão de partilha e colaboração. A obra é uma passagem que reconhece a presença dos outros sonoramente; que existe e exige uma relação. Organiza-se enquanto peça, sempre parte e sempre inteira, situação imagético-sonora que emerge por conseqüência de um trajeto em que imagem e som são investigados reciprocamente, para caberem um no outro por descompasso e desfasamento.
Mesmo trabalhando com imagens, procuro uma posição que não exclua o sensível ou o invisível. As imagens que proponho sabem da sua capacidade de ser experiência e não refazer experiência. O processo de realização de Pendular envolveu, assim, uma permanência no deslocamento: habitar os acontecimentos diminutos de cada lugar, colecionando e apagando imagens até encontrar aquela que resta, que fica. Afinal, produzir uma imagem é aceitar a interpelação inevitável das imagens mundanas e cotidianas, fabricadas como verdades pelo senso comum, e, ao mesmo tempo, investigar, em micronegociações, os modos possíveis de infiltração e escape.
De alguma maneira, a obra sugere uma resistência, uma vez que parece ir na contramão das lógicas atuais econômicas e de trabalho, encontrando seu território de referência em relações subjetivas e íntimas. Desenvolvi um enfretamento silencioso do 'caminho' que nos é imposto e busquei amplificar o que é soterrado. Apropriando-me de acontecimentos sociais e singulares, sem gerar uma hierarquia, e assim componho a imagem. Creio que essa imagem deve ser tomada em uma dimensão além da visual, mas corpórea e também reflexiva, mesmo sem expressar um tema ou assunto identificável de modo explicativo.
Preferi, na obra, ocupar a imagem, não expondo os outros senão através da sua presença sonora: compreendo que essa é a maneira pela qual entro em participação e esboço uma conversa entre dois modos de estar e ser corpo; corpo-imagem e corpo-som. O que faço com o corpo não é algo que o outro não possa fazer; essa posição é que faz do meu corpo uma imagem, e não um eu em particular. Para mim, o simples olhar é um compartilhar e acho que é permitido sacar uma narrativa, um frame, para levar no bolso. Gosto da ideia de que uma imagem pode ser levada; de que quem a acessa fica sempre com qualquer coisa."
Waléria Américo em depoimento à PLATAFORMA:VB (julho 2015)