" Enquanto artista, acredito no engajamento político e nas vozes dos oprimidos enquanto poética. No vídeo ABC-lynching, trabalhei basicamente com aspectos linguísticos e, portanto, sociais. Observei e assisti centenas de imagens que encontrei do 'Occupy Pedofilyai', organização de alcance nacional na qual jovens ativistas absolutamente diferentes entre si, de mais de 50 cidades em toda a Rússia, Ucrânia e Cazaquistão, pegam “pedófilos” e os espancam. Esses vídeos foram minha única fonte de pesquisa sobre o fenômeno do linchamento, ou, por assim dizer, do bullying masculino aprovado pela maioria dos russos.
Em 2013, 78% das pessoas entrevistadas na Rússia afirmaram acreditar que os gays e as lésbicas são pessoas doentes, imorais ou psicologicamente perturbadas. Muita gente ganhou dinheiro seguindo essa tendência usando a tag ‘homofobia’, por ser obviamente algo lucrativo. Um desses empresários de sorte é o famoso ativista neonazista Maxim Martsinkevich ‘Tesak’ (que significa ‘facão’ em russo), criador do 'Occupy Pedofilyai', que alega capturar pedófilos, mas na verdade esses ativistas sociais atraem e torturam pessoas LGBT. Em 2012 e 2013, a popularidade do Occupy Pedofilyai era espantosa, e ficava claro pelos comentários postados nos vídeos, disponibilizados no Youtube, Rutube e Vkontakte (Facebook russo), que o público comum da Rússia, em linhas gerais, aceita esta atitude.
Um dos objetivos de meu trabalho era trazer o fenômeno do Occupy Pedofilyai à cena de arte contemporânea da Rússia, porque a figura de Tesak enquanto ativista skinhead extremista representava o discurso da direita mais radical.
Entretanto, pouca gente sabe que apesar de suas ações, nenhum dos ativistas do Occupy Pedofilyai foi a julgamento. A única discussão gerada pelo meu vídeo foi uma entrevista com a artista russa Kazhdan, no site russo colta.ru.
Eu vinha trabalhando com os vídeos durante muito tempo para criar ABC-lynching, mas não conseguia encontrar a forma apropriada para trabalhar a ideia da linguagem do bullying. Para explorar a linguagem e suas transformações, prestei atenção às principais perguntas feitas pelos ‘ativistas’ às vítimas – coloco ‘ativista’ entre aspas porque é praticamente impossível chamar essas ações de ativismo sem qualquer conotação negativa. Todos eles trabalham mais ou menos da mesma forma: eles fazem as mesmas perguntas às vítimas e realizam os mesmos atos agressivos em todos os vídeos. Assim, dividi o vídeo em perguntas típicas e as repeti, portanto a lista de perguntas desconstruídas analisa uma relação social na Rússia com os LGBTs, imigrantes, pessoas ricas e pobres."
Maria Kramar em depoimento à PLATAFORMA:VB (julho 2015)
