Performance Diária

2011
Felipe Bittencourt
publicado em 21.09.2015
última atualização 21.09.2015

“Este projeto surgiu de forma fluida e despretensiosa, se adaptando às inquietações que surgiram na sua elaboração.
Sempre pensei a performance como linguagem de atividade e constante questionamento e  falar sobre registro de performance enquanto discurso costuma me dar coceiras. Me incomoda a ideia de apresentar um trabalho ao vivo e, em seguida,...


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“Este projeto surgiu de forma fluida e despretensiosa, se adaptando às inquietações que surgiram na sua elaboração.
Sempre pensei a performance como linguagem de atividade e constante questionamento e  falar sobre registro de performance enquanto discurso costuma me dar coceiras. Me incomoda a ideia de apresentar um trabalho ao vivo e, em seguida, para mantê-lo exposto, deixar no espaço um roteiro escrito, uma partitura, ou fotografias e vídeos. Procurei algumas estratégias para solucionar de forma mais abrangente o registro como ferramenta poética em si e não somente como recurso de preservação da memória ou de transformação de recordações em produtos. 

Em trabalhos recentes, propus a permanência de cenários, do título e de uma breve descrição da performance, sem imagens ou pistas sobre as ações ali exercidas. Com isso percebi que meus projetos sempre abarcavam uma cenografia ou o uso de objetos que se relacionavam com meu corpo e suas dimensões.

Em obras como Geometria sobre conforto (2011), Lições para pessoas e coisas (2011) e Ponto de fuga (2012), objetos utilizados nas performances indicavam o ocorrido e aludiam a presença de um corpo através de sua ausência. Isso levou o público a ´experimentar´ os cenários ou a adaptar seus corpos a uma situação criada para o meu. Isso me estimulou a pensar como a participação ativa não se resume a observar e refletir. A partir do registro, também é possível gerar extensões dessas ações propostas pelo público.

Estes fatores fundamentaram a elaboração de Performance Diária. Resolvi desenhar uma performance por dia sem estabelecer limites de tempo. Esses desenhos deveriam ser acessíveis através de um blog onde eu tinha como regra postar todos os dias, até as 10 horas da manhã. Pensava o ato de desenhar como performance e o de postar como registro vivo e ativo destas ações. 

Essa dinâmica gerou seguidores que me apresavam quando o horário de postagem se aproximava e a pressão resultou em erros de escrita, desenhos não tão aprimorados e ideias ansiosas e pouco criativas. O processo me fez perceber a importância de ser legítimo com as quebras nas minhas intenções, sempre muito bem estipuladas e seguidas. As postagens registravam meu estado emocional diário e, assim, decidi criar uma cartilha emocional de um ano.

A editora N’Versos, publicou a obra como livro e, a partir daí, muita gente começou a desenhar e me enviar fotos das ações, gerando uma nova cadeia de pesquisa e documentação. Nela eu não era o realizador, mas um propositor. Nessa dinâmica foi criado O PERFORMER, um personagem autor dos desenhos, concebido como o artista atuante nas ações imaginativas. Isto desencadeou o blog O PERFORMER, ainda em andamento, no qual ele é o autor.  

Quando o trabalho foi exposto percebi que o público buscava nos desenhos seus dias de aniversário ou datas específicas. Algumas pessoas visitavam constantemente a exposição para ver, rever e se alimentar daquilo. Isso gerou um campo aberto de recepção e observação e deixou claro a importância do registro como proliferação de conhecimento em oposição à ideia de simplesmente documentar um acontecimento. 

Todos estes aspectos se relacionam com a performance e seus questionamentos. Ao lidar com a conexão direta com o público são geradas infinitas memórias. E esse trabalho, para minha emoção, performa e é performado.” 


Felipe Bittencourt em depoimento à PLATAFORMA:VB (julho 2015)


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Dados técnicos

Performance Diária, 2011 | Instalação
Felipe Bittencourt

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19º Festival
Outras conexões

 “Muitos recursos referentes à discussão de arte, além de relacionados ao meu cotidiano, foram se agregando. Cito e dedico diversos desenhos a alguns artistas como René Magritte. Em outros, estabeleço uma relação sensível direta com os observadores a partir do universo dos contos de fadas.

Há também referências ao mundo da música pop, gastronomia, cinema, teatro, dança, quadrinhos. Quando se trata da vida e de seu cotidiano como ponto de partida de criação, não há limitações sobre aonde buscar influências. Há multiplicações: elas estão em tudo e em todos.” 

Anexos

Email enviado ao artista por professora universitária do Chile que propôs como exercício de aula o desenho Memorize seu lar

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