"Em Samba #2 escolhemos trabalhar com o clichê do samba como uma pesquisa social/fisiológica/artística desta fisicalidade tão exclusivamente brasileira. A desconstrução do movimento permite uma percepção visual do que há de mais visceral sobre o samba: sua energia primitiva. É como se nossos olhos finalmente pudessem...
"Em Samba #2 escolhemos trabalhar com o clichê do samba como uma pesquisa social/fisiológica/artística desta fisicalidade tão exclusivamente brasileira. A desconstrução do movimento permite uma percepção visual do que há de mais visceral sobre o samba: sua energia primitiva. É como se nossos olhos finalmente pudessem ver o que sempre compreendemos sobre ele – sua luxuria e indomesticável fisicalidade.
A obra trabalha com este clichê não para promovê-lo, mas para subvertê-lo; possibilitando uma nova percepção, uma desconstrução não só do movimento, mas da materialidade corporal da 'bunda'. Quando ela perde a materialidade com a qual nos identificamos e se torna uma natureza tão primitiva do corpo, ultrapassa o bonito/feio. Torna-se um retrato físico, um movimento da natureza brasileira com suas paisagens selvagens e luxuriantes.
Samba #2 é a segunda parte de um projeto chamado Samba (o #1), filmado como parte da performance EXIT, que trata da crise do artista de meia idade. Durante a performance a passista do samba é usada como metáfora para o sonho original da bailarina na caixinha de musica — uma caixinha de música brasileira. Sete anos mais tarde, quando surgiu a possibilidade de fazermos um projeto onde teríamos as condições para filmarmos o Samba com a câmera Phantoom, que possibilita uma filmagem bem mais lenta (500 quadros por segundo), uma 'dança da carne' como inicialmente imaginalmos, 'pulamos' em cima.
No Samba #1 a câmera rodava em volta da passista, enquanto a passista girava em torno de si mesma. No Samba #2, a câmera está estática. A simplicidade do take sem movimento, onde somente a carne, a pele move, oferece um perfil de estudo, uma dissecação do corpo que dança o samba, esta manifestação cultural tão importante para o brasileiro, que revela nossa mais profunda fisicalidade. O enquadramento, resgatado da TV com a qual crescemos, e que apelidamos de “enquadramento Chacrinha”, é apertado nos quadris. O corpo fala por si.
Este trabalho situa-se no amago de tudo que nos interessa: a presença necessária para improvisar o movimento do samba; a relação entre as partes do corpo, onde a tensão entre os quadris contra as pernas forma uma coreografia visceral e imprevisível, com profunda estranheza, porém, resgatada de um lugar familiar; a apropriação física de um clichê transformando-o numa experiência física que o transcende; e nossas histórias pessoais, como brasileiras em busca de compreender o que isto significa.
Ambas somos do Sul, de Curitiba, e descendentes de europeus ocidentais, com pouca semelhança física com o estereotipo da mulher brasileira. Apesar de brasileiras e dançarinas, nenhuma das duas sabe sambar. Assim, o samba para nós tem uma familiaridade que não nos pertence. É uma manifestação cultural com a qual nos identificamos, mas com uma certa estranheza. Esta impossibilidade de pertencer pode ter sido a fonte da nossa fascinação e insistência em disseca-lo. Além disto, queríamos tratar do questionamento entre a objetificação do corpo da passista, ou da mulher em geral, e a autoridade por ela conduzida, ao autorizar que o público assista às suas alegorias.”
Chameckilerner em depoimento à PLATAFORMA:VB (julho 2015)
- Dados técnicos
Samba #2, 2014 | Vídeo, 2’36”
Chameckilerner
Cassino do Chacrinha | Globo | Anos 80
- Ações VB
- 19º Festival