Emissão

2014
Carlos Melo
publicado em 21.09.2015
última atualização 21.09.2015

"Minha obra tem se estruturado num tripé: corpo, política e natureza. Em Emissão, minha leitura e a dublagem da atriz Renata Sorrah do Manifesto do Rio Negro, escrito pelo crítico francês Pierre Restany, sintetiza de alguma maneira esse tripé. O manifesto enfatiza a exuberância da Amazônia e a importância da arte...


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"Minha obra tem se estruturado num tripé: corpo, política e natureza. Em Emissão, minha leitura e a dublagem da atriz Renata Sorrah do Manifesto do Rio Negro, escrito pelo crítico francês Pierre Restany, sintetiza de alguma maneira esse tripé. O manifesto enfatiza a exuberância da Amazônia e a importância da arte contemporânea dialogar com a natureza, mesmo que subjetivamente. Ter lido o manifesto e percebido nele conteúdos simbólicos que reforçavam minhas pesquisas foi o ponto de partida para a realização do trabalho.

O outro, um estrangeiro, dá voz a questões que são nossas. Convidar uma atriz como a Renata Sorrah para dublar minha leitura, filmar isso e chamar de Emissão, é para mim conceber uma obra a partir de encaixes, como um quebra-cabeça que vai sendo construído sem que se perceba que imagem vai revelar. Numa obra como essa, a linguagem é tão conceptiva quanto o que ainda não é visível. Existem trabalhos que se resolvem com um desenho, com uma performance ou com um vídeo. Só o processo pode resolver isso.

O fato de Emissão se materializar como um vídeo coloca o trabalho esteticamente dentro de um platô de imagem e som. O que aciona outros aspectos, como a poética de um corpo “encarnado”, possuído, um corpo “trans”. O espectador participa da assinatura do manifesto, subjetivando-o, tomando para si algo que nos representa, que é a comunhão do homem com a natureza. E a arte é uma interlocutora desse encontro. 

Já faz tempo que convido atores e utilizo textos de outras pessoas nos meus trabalhos. Palavra e imagem sempre foram plataformas recorrentes e conceber uma obra é um conjunto de fatores: prática, assunto, suporte e tempo. Esse vídeo sinaliza um momento de muita clareza e maturidade na minha produção, que completa quase quinze anos. Ter uma poética é algo que pede tempo. E ser sensível a ela é, em todos os sentidos, caro. Acredito numa construção, acho que todo trabalho artístico é um poema in progress.

Vivemos uma época onde a política, a geopolítica e a arte engajada se renderam à urgência de tratar de algumas questões. Na arte contemporânea, talvez, exista uma ideia de acionar assuntos ligados à filosofia, ciência e comunicação, que são de fato impulsionadores de ações políticas não necessariamente panfletarias. Fazer vídeo e performance pra mim tem sido a maneira mais eficiente de tratar de assuntos que me interessam, que me ocorrem ou que sinto que domino.

O titulo desse vídeo é Emissão, daí, emitir, propagar, difundir, sugerir, informar talvez seja o “barato” desse trabalho. Me utilizo de um texto/manifesto escrito na década de 70 e que ainda ecoa como uma tomada de consciência para questões que estão tão próximas, tão latentes, como a natureza e sua importância na construção da subjetividade. Tudo isso me fez lembrar da minha avó, que dizia: “hoje eu não estou com a natureza muito boa”, se referindo a algo interno, sensível, intuitivo. Acho que foi dessa maneira que entendi o que o Pierre Restany chama de “ natureza subjetiva”."


Carlos Melo em depoimento à PLATAFORMA:VB (julho 2015)


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Dados técnicos

Emissão, 2014. Da série Emissão | Vídeo, 10’06
Carlos Mélo

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