"Esta série de fotos intitulada Jugando (Brincando) foi feita em Santa Cruz, a cidade mais rica da Bolívia. Composta por mais de cem imagens apresentadas num slide show, a série mostra um grupo de meninos – três irmãos e um primo – me apresentando seu bairro, numa região periférica da cidade. A série foi fotografada em 2010...
"Esta série de fotos intitulada Jugando (Brincando) foi feita em Santa Cruz, a cidade mais rica da Bolívia. Composta por mais de cem imagens apresentadas num slide show, a série mostra um grupo de meninos – três irmãos e um primo – me apresentando seu bairro, numa região periférica da cidade. A série foi fotografada em 2010 e editada em 2015 e será exposta pela primeira vez durante o Videobrasil.
A cidade de Santa Cruz fica na região tropical do país, diferentemente da capital La Paz, que está localizada na parte alta da Cordilheira dos Andes. Quando essas imagens foram registradas, a população da região estava bastante insatisfeita com o governo do presidente Evo Morales. Entre outras coisas, as pessoas acreditavam que o governo de Morales privilegiava as regiões de maior altitude do país, apesar da riqueza gerada pelas terras baixas. Santa Cruz havia proposto sua secessão da Bolívia.
Apesar da existência de bolsões de riqueza significativos e das melhorias na economia, é comum ver crianças trabalhando na Bolívia e em toda a América Latina. No entanto, para alguém que não passou muito tempo em Santa Cruz, a visão de crianças carregando materiais numa charrete velha puxada por cavalos surpreende, embora não seja inédita. Fiquei tão intrigado que, quando vi um grupo de garotos conduzindo uma charrete, conversei com eles sobre um projeto de vídeo. Posteriormente, me reuni com eles e com seus pais, mas abandonei a ideia do vídeo e simplesmente pedi aos meninos que me mostrassem a região onde moravam enquanto eu fotografava.
Esta série foi fotografada em uma única tarde. Como nada foi planejado, as imagens resultantes foram produto de uma espécie de jogo que aconteceu entre eles, a câmera e eu. Eles brincaram entre si, entraram na brincadeira e buscaram maneiras de me surpreender, e eu me agarrei à charrete, que corria de um lugar para outro por estradas de poeira.
Visitamos um cemitério, uma criação de avestruzes, uma fazenda de mamão, construções e até tropeçamos nos restos do que parecia ser uma oferenda ritual animal; nesse meio tempo, surgiu uma dinâmica social complexa. Ficou evidente que o desenvolvimento econômico estava deixando de lado muitas das pessoas que mais poderiam se beneficiar dele. Havia sinais visíveis de tensão e insatisfação com o governo. A cada passo havia lembretes das coisas que a pobreza exige das pessoas. Porém, em meio a tudo isso, passei a acreditar que o ato de brincar era um mecanismo muito importante empregado por esses garotos como ferramenta de mediação entre eles e seu ambiente.
Por mais desafiadoras que algumas das imagens possam ser, o que se apresenta é um senso de brincadeira e de inocência que permanece mesmo em meio a uma experiência completamente destituída de privilégio e vantagem. Por meio da brincadeira, estes garotos superaram limites, reafirmaram suas relações, questionaram hierarquias e estruturas sociais e até contestaram ideias relativas de vida e morte."
Andres Bedoya em depoimento à PLATAFORM:VB (julho 2015)
- Dados técnicos
Jugando, 2010-2015 | Fotografia/vídeo, 11’02”
Andres Bedoya
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