"Os desafios geopolíticos, geoestratégicos, a ditadura, as guerras fratricidas e todo o tipo de insensatez de algumas elites governantes fizeram, e fazem, da África o berço de agitações de diversas ordens, como a guerra, o genocídio e outras formas violentas de opressão.
Mas, deve-se saber que em toda situação de guerra e de instabilidade, a qual somos submetidos ou que submetemos o outro, ninguém é poupado, independentemente da posição. Porque somos apenas seres humanos.
Tomo evoca a língua bambara [idioma falado no Mali] de forma literal: um território abandonado por causa da guerra. Conflitos armados e conflitos mentais. Aquele que vem e guia o espectador pelo filme está reduzido a um braço que apresenta um olhar transtornado. Ele se move a passos frenéticos de animal acossado, atravessando lugares vazios e encontrando somente fantasmas e sinais de abandono. Esse filme simboliza o 'tout blessé' [todo ferido], ou seja, as feridas no corpo e as feridas na mente.
Em Tomo, a ação se desenrola em um universo onde os vivos desapareceram, substituídos por ectoplasmas em um simulacro da vida. Tomo trata da guerra em geral, e usa a ruralidade do Mali como um pano de fundo neutro para a perturbação que a guerra causa a todas as psiques do mundo. A violência, quando passa, destrói tudo ao seu redor, tanto no plano físico quanto mental. É um caminho deserto e sem esperança.
Para marcar essa violência complexa, utilizo objetos, cortes, estrondos, resfôlegos, pequenos sons da vida, o barulho do vento, sons de percussão, cantos, a crepitação do sol e do fogo. Fantasmas de chamas e fumaça realizam ações cotidianas no lugar dos seres vivos, próximos da realidade.
O filme reivindica a não-violência, não contém imagens sangrentas e se desenrola em uma narrativa essencialmente expressiva sem cair no psicologismo ou em questões morais. Tomo se abre ao stress mental, à fuga vã e desesperada, e à alienação coletiva. Sua força e poder de perturbação se devem a uma construção na qual três níveis de espaço-tempo estão em perpétua conspiração: o passado, a alucinação, a realidade. O espectador fica, ao mesmo tempo, lado a lado com espectros em chamas, sua interioridade, e os mundos invisíveis."
Bakary Diallo em depoimento à PLATAFORMA:VB (outubro 2013)