“The Mapping Journey Project trata de indivíduos forçados a viajar clandestinamente, e mais especificamente dos discursos, das estratégias e das táticas de resistência que eles desenvolvem em suas narrativas, com suas próprias palavras e línguas. Filmado em seis cidades – Marselha, Ramallah, Roma, Barcelona e Istambul –, cada um dos vídeos que compõem a instalação mostra mapas políticos do Mediterrâneo, nos quais os depoentes desenham os trajetos de suas viagens, revelando uma cartografia oculta de resistência.
Alfred Korzybski disse que ‘O mapa não é o território’. Mas ao trabalhar no The Mapping Journey Project, pensei que o mapa poderia ser o território, sob a condição que não fosse produzido a partir da perspectiva do poder, mas por vozes humanas, por experiências e gestos subjetivos.
Ao utilizar mapas, tentei refletir sobre a articulação entre geografia e jornadas pessoais, me perguntando como reverter a vocação dos mapas como armas de poder e controle, dando esse poder às pessoas que os utilizam contra fronteiras arbitrárias. A cartografia é capaz de gerar narrativas? Os mapas podem ser, literalmente, superfícies nas quais – ou a partir das quais – um discurso de resistência pode ser elaborado? Em última análise, o The Mapping Journey Project trata disso: como um ser humano consegue resistir mesmo depois de ser capturado pelas redes de um poder arbitrário.
Há também questões estéticas em pauta, definidas por Edward Said como ‘exílio, imigração e o cruzamento de fronteiras (como) experiências que podem nos trazer novas formas narrativas e outros tipos de relato’. No meu caso, trata-se mais especificamente de me interrogar sobre como produzir uma imagem do que é arbitrariamente confinado às margens. E também sobre qual o status da oralidade e da linguagem em relação a esses temas. Como a oralidade é parte de um processo de empoderamento? Como a oralidade é parte de uma imagem? Estas questões formam uma investigação constante ao longo do meu trabalho, que pode ser identificada também em obras mais recentes como The Speeches Series (Trilogia em vídeo, 3 filmes digitais, 2012-2013) e Garden Conversation (Filme digital, 2014).
Em última análise, investigo de que maneira discursos e gestos de resistência encontram a poesia. Este é o foco de The Constellations (8 serigrafias, 2011), que formam o capítulo de encerramento The Mapping Journey Project. Ao traduzir os desenhos mostrados no The Mapping Journey em constelações, tais como as usadas em mapas do céu, The Constellations borra os limites entre o mar e o céu, a favor de um espaço liberado das fronteiras terrestres.
A partir dessa perspectiva, The Mapping Journey Project e suas Constellations podem ser vistas – para citar Michel Foucault e sua Vida dos homens infames (1979) – como uma ‘antologia de vidas individuais (...) que se tornaram, através de não sei quais acidentes, estranhos poemas’.”
Bouchra Khalili em depoimento à PLATAFORMA:VB (agosto 2014)