Todas as vozes

2011
Carolina Caliento
publicado em 11.10.2013
última atualização 08.09.2014

Gostaria que nossa conversa percorresse o movimento de transformação de algumas questões presentes no seu trabalho. Em nosso primeiro encontro, lembro que você falou sobre uma negação de uma linguagem que se definisse como autobiográfica e uma preocupação com o contexto. Outras questões giravam em torno de uma volta à...


Leia mais +

Gostaria que nossa conversa percorresse o movimento de transformação de algumas questões presentes no seu trabalho. Em nosso primeiro encontro, lembro que você falou sobre uma negação de uma linguagem que se definisse como autobiográfica e uma preocupação com o contexto. Outras questões giravam em torno de uma volta à pintura, das referências da pintura histórica, da materialidade da fotografia, dos usos dos arquivos de imagens. Não posso esquecer quando você falou do “registro inegável do real”, que o céu é o seu sublime e que juntos esses aspectos dão a carga dramática do seu trabalho.
Gal, queria primeiro falar sobre essas poéticas muito pessoais. Talvez eu não tenha formulado direito, porque é óbvio que também trabalho em cima de uma poética pessoal. Não é simplesmente uma negação de uma poética autobiográfica. O que me move é que eu quero discutir a cidade, a percepção da imagem, em planos de linguagem, de como articulo elementos para transformar um trabalho. Quando falo dessa negação é uma definição do que eu não quero fazer: trabalhar em cima de contextos muito autobiográficos não me interessam. Não sei se chega a ser uma coisa tão digna de nota. Porque é óbvio também que vejo as coisas e trabalho sob o meu ponto de vista, sob uma ótica e uma poética muito pessoal. É preciso deixar isso claro.

Acho que isso já havia ficado muito claro para mim, anteriormente. O seu olhar não era para dentro, de diário, de retomar intimidades... por mais que isso exista, mas sempre vi uma preocupação com o entorno, com um diálogo com o de fora, em reter essas relações com o externo. Por mais que as relações sejam pautadas subjetiva e particularmente. Acho que o que você está dizendo não nega isso.
É um campo difícil de se discutir, porque acho que entra em outros méritos. Não é produtivo negar tudo. Tenho uma vontade de trabalhar o mundo e trabalhar outras coisas que dizem respeito a mais gente do que somente a mim. Isso tem a ver com o contexto social. Parto de algo que eu acho que é comum a todos. São imagens de mídia impressa, de grande circulação.
Tenho pensando ultimamente que meu trabalho tem muitos fragmentos, que se unem e que criam tensões entre si. E também que a nossa experiência é fragmentada. A forma com que as coisas circulam e a velocidade com a qual a gente entra em contato com as informações também diluem muito a experiência e aumentam essa fragmentação. E de repente é uma sequencia de coisas distintas que passam diante dos nossos olhos e a gente acaba absorvendo como conjunto: cenas do mundo, da vida, que vão desde a novela mais absurda, à guerra, à propaganda. E é surreal. Eu trouxe um jornal desses que distribuem no metrô. E a primeira capa é um comercial do Dorflex. A capa inteira é um anúncio.

É uma capa falsa de publicidade.
Eu trouxe o jornal, preciso mostrar para que você entenda. “O mundo em que ninguém sente dor” é o título desse anúncio, que funciona como capa. E isso parece muito real, mas é um anúncio. Depois de ler essa capa que ninguém sente dor, a gente vê o jornal real com a manchete da capa se referindo à morte de um ciclista atropelado. Acho que esses dados de linguagem que são comuns me movem a trabalhar com esse tipo de material. Eu ainda estou muito nas conjecturas, pensando sobre hipóteses. Mas acho que hoje em dia, não existe essa dimensão do impossível. Qualquer absurdo é passível de acontecer, o desejo virou executável sempre. Acho que se perdeu uma certa medida da experiência do mundo. Há outras tensões criadas sobre o desejo, por meio da propaganda. O espaço físico virou um cenário de acomodação. É uma dimensão materialmente palpável: é um espaço que de fato eu atuo, domino, e modifico. Mas o espaço já vem como dado, e as ações já vêm mediadas por uma certa ideia.


Entrevista realizada pela pesquisadora Galciani Neves com a artista Carolina Caliento, durante a residência artística Ateliê Aberto #4, uma parceria entre SESC, Videobrasil e Casa Tomada.
[leia na revista abaixo a entrevista na íntegra]


Reduzir texto -

Leia na íntegra esta entrevista, publicada na revista Convivências #4, realizada em ocasião da residência artística Ateliê Aberto #4. [pt]

Em residência.

Em residência.

Em residência - semana 3.

Ações VB
17º Festival
Outras conexões

Blog de Galciani Neves no projeto.

 

Blog de Carolina Caliento no projeto.

 

Sobre Pintura Histórica, na enciclopédia de artes visuais do Itaú Cultural: "Em acepção mais estrita, refere-se ao registro pictórico de eventos da história política. Batalhas, cenas de guerra, personagens célebres, fatos e feitos de homens notáveis são descritos em telas de grandes dimensões."

Anexos

A entrevista na íntegra. [eng]

Comentários